24/06/14

Estaleiros de Campinas




De forma ritmada e com a precisão dum ourives de Viana, o chefe de equipa ía solicitando com voz roufenha de cachaça e tabaco, os instrumentos de que necessitava para reparar as secções danificadas.
A cada solicitação do chefe os serventes acenavam de imediato com o utensílio, gritando com sotaque vincadamente alemão – “Prronto!”
- Serrote!
- Prronto!
- Chave inglesa!
- Prronto!
- Rebarbadora!
- Prronto!
- Óleo!
- Prronto!
- Martelo!
- Prronto!
- Eu disse martelo, porra, não disse marreta!
- Prrontos, desculpe...
- Desculpe a prima. À conta destes enganos dei cabo dum que estava quase bom!…
À fina ironia do chefe, respondeu toda a equipa com uma monumental gargalhada. O chefe era especialista em tiradas humorísticas assertivas e perspicazes. Considerava mesmo que, em vez de anos e anos a queimar as pestanas, poderia perfeitamente ter vingado no stand-up.
- Ó chefe, e daquela vez em que pusemos pastilha Gorila nos travões do gajo? – recordou um dos serventes.
Imitando o sotaque do xerife de campo, num subtil sibilar de sopinha-de-massa, o chefe dos estaleiros atirou nova graçola:
- Aqui trabalha-se… com tranquilidade… com tranquilidade…
Nova risada geral.
A humidade e o calor tornavam o ar irrespirável e faziam toda a equipa suar em bica, obrigando a algumas paragens técnicas para hidratação, com choupinhos, caipirinha e shots de cachaça de jambu, aliás, os mais apreciados pelo chefe de equipa, que também não dispensava um bom forró como música ambiente para lhe aumentar “os índices de concentração”.
Volvidos alguns minutos de aturado trabalho de recuperação, o chefe chamou um dos directores de serviço, um baixote de madeixas aloiradas experiente em cenas de pugilato com árbitros, e deu-lhe indicações precisas:
- Este está pronto. Leva-o para o balneário e diz ao Bento que, pelo menos um quarto de hora funciona. Depois disso, não garanto nada.
- Mas sempre se arranjam onze? – retorquiu o baixote.
- Olha-me este. Onze? Ò menino, nem tu sabes o que eu consigo improvisar com material em segunda-mão.
Toda a equipa de serventes respondeu de imediato com uma solidária gargalhada forçada.
Colocaram Postiga no porta-paletes e ficaram a admirar o baixote desaparecer no corredor empurrando o carrinho com afinco.
Um dos serventes, que há alguns minutos atrás rira de forma desbraga, mas que não tinha percebido o alcance da piada, remoendo a frase enigmática solicitou uma aclaração:
- Ó chefe, aquela da marreta… foi na cabeça do Pepe, não foi?



10/06/14

Abanou, mas não caiu!


De súbito sentiu o chão fugir-lhe debaixo dos pés. Nem mesmo no famigerado dia em que Paulinho decidira tornar irrevogável o primeiro divórcio registado em Portugal entre pessoas do mesmo sexo, sentira algo semelhante - um frémito que lhe percorria a espinha e lhe entaramelava a língua, tornando turva a realidade e fazendo-lhe cair sobre os ombros uma responsabilidade que juraria não ser sua.
Pressentindo o inevitável, suspendeu a lenga-lenga, revirou os olhos, bufou, vacilou e por fim deixou-se cair suavemente e em segurança nos braços fortes e peludos do oficial de serviço.
A alguns passos de distância Pedro não esboçou sequer um reflexo de socorro, demonstrando um auto controlo digno de registo – era preciso manter a pose e um verdadeiro homem de Estado não vareja! Ainda olhou de esguelha para o presidente do Constitucional, que ao seu lado se entretinha a tirar chumbo das unhas, mas este também na reagira.
Na plateia, Nogueira e os sete anões que o acompanhavam e que desde o início da função não tinham parado sossegados um minuto, exultava de contentamento, convencido de que as palavras de ordem que gritavam desde o início se haviam tornado no feitiço que começava a derrubar o regime. Nogueira sentia-se um autêntico Harry Potter, agora mais do que nunca, convencido dos seus próprios poderes. Talvez até quando saísse dali fosse lançar uma macumba sobre o mundial e, num passe de mágica, paralisar todo o metro de S. Paulo. A ideia pareceu-lhe excelente e exequível. Coincidência ou não no Brasil os metroviários agitaram-se, confirmando o ditado - Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay...
Percebendo que o momento era de emergência o mais alto graduado tomou posse administrativa do micro e, anunciando que falava na qualidade de guarda-freios, pediu aos sete anões “mais respeito” pela instituição e informou a populaça que eram horas de “damas ao bufete”. Seguro, sentido que iria de novo ser apanhado desprevenido, apalpou atrapalhadamente os bolsos do casaco cerzido com fina seda afegã, na ânsia de encontrar uns trocos para pagar uma gasosa a Costa. Felizmente haviam sobrado setenta e cinco cêntimos da última campanha para as europeias. Mas eram os últimos e Seguro sabia da insaciável sede de Costa.
Enquanto isso, em Santarém, entre um tinto e duas rodelas de paio, Jerónimo, informado do sucedido através de um velhinho mas seguro “oki-toki” do tempo da guerra-fria, acendia uma velinha a S. Bento pela saúde do enfezado e pela queda do governo.
Cavaco, já todos percebemos, não é pressionável nem impressionável, de acordo com as palavras do próprio. Mas a sua vulnerável condição humana não o livra duns abanões da mãe natureza, sempre sabia e atenta – “Acorda Cavaco, cumpre com as tuas obrigações e deixa-te de achaques! Afinal de contas és um homem ou és um rato?”
Após alguns minutos de minuciosa inspecção por um perito militar em minas e armadilhas, Cavaco voltou mais fresco e leve do que nunca, ignorando por completo todo o enquadramento - um povo que sofre e um país que se afunda sem esperança, às mãos de uma corja de incompetentes! Porém, retomando a palavra citou Camões:

“Vede, Ninfas, que engenhos de senhores
O vosso Tejo cria valerosos,
Que assim sabem prezar, com tais favores,
A quem os faz, cantando, gloriosos!"

Viva Portugal!
Viva!


Piada de Caserna


Com o chumbo pelo Tribunal Constitucional dos novos cortes nos subsídios dos funcionários públicos, dos temporariamente doentes, dos sem emprego e dos sobreviventes, o governo procura medidas alternativas para cobrar a receita “roubada” pelos implacáveis juízes do palácio Ratton. Em cima da mesa estarão já algumas medidas substitutivas, nomeadamente relativas a mais cortes na saúde.
De acordo com rumores, Passos Coelho e Paulo Macedo estudam já a possibilidade das endoscopias e das colonoscopias serem substituídas por selfies. Parece-me bem. Se quiserem até me ofereço como voluntário para os primeiros testes. Uma polaróide ao vesgo não custa nada e até evita a intolerável invasão do atrevido tubinho.
E para que a selfie fique mais composta estou até a pensar em deixar crescer a barba, que é como quem diz, e tatuar o Cavaco e Silva numa nalga e o Bruno do Carvalho na outra. Modernices...


06/06/14

Micro-deuses





“Um líder à altura... António Costa: o mesmo que foi eleito para o PE e esteve lá apenas um ano. O mesmo que deixou de ser Ministro para ser Presidente da CML e agora, meses depois de ter afirmado que estaria em Lisboa com 'os dois pés' já está de malas aviadas para o Largo do Rato.
Oportunista, tacitista, maquiavélico e sei lá que mais não auguram nada de bom para um Líder partidário.”

(comentário do Sr. N. Araújo no faceboock do deputado Dr. Feteira Pedrosa)

É que até apetece citar o Criador: “quem nunca pecou que atire a primeira pedra”. Não é assim senhor ex-prior?